
A sombra é o submundo do ser humano.
Muito ouvimos falar sobre a sombra. Essa figura arquetípica exerce um fascínio sobre a imaginação de todos, principalmente quando se fala sobre o comportamento das pessoas, pois ela se refere ao mais profundo do ser humano, ao submundo onde residem as instâncias mais primitivas e selvagens que aparecem nos noticiosos policialescos. No mundo físico somente a luz pode dissipar a sombra, e o mesmo se dá no mundo interior.
“Você não conhece o poder do lado sombrio.”
Como base dessa instância insana, temos o mais primitivo e visceral dos instintos: o egoísmo, essa força feroz da autopreservação não só da vida material, mas das afeições e das projeções que regulam a sensação de aprovação e aceitação em uma sociedade cada vez mais autocentrada nos estereótipos de valor e poder.
Esta criatura, alojada nas mais profundas cavernas das emoções, é a sombra. Ela representa toda a força, a estrutura e a organização do lado sombrio da alma. É o local onde são produzidas todas as maldades e violências que assolam a nossa Terra.
“O medo é o caminho para o lado negro.“
O mergulho interior é necessário para enfrentar os inimigos ocultos.
Certamente o homem, como um todo, não é tão bom como pensa ser. Todos possuem uma sombra e, de fato, quanto menos essa sombra aparece conscientemente, mais profunda, pesada e escura ela é.
Quando um sentimento de inferioridade é consciente, sempre será possível melhorá-lo, pois reconhecer o que necessita de atenção proporciona a possibilidade de mudanças.
“Que a força esteja com você.”
Mas se ele for escondido e tirado da consciência, por não se querer expor a falha, nunca será corrigido. Além disso, são esses materiais reprimidos que inesperadamente podem explodir, causando as crises emocionais.
Segundo Jung é preciso aceitar integralmente a sombra. Ele diz que é nosso trabalho na vida nos aceitarmos totalmente e, então, integrar a sombra na personalidade.
Uma frase dele que frequenta muito os perfis da redes sociais mostra o caminho:
“Aquele que não atravessa o inferno das suas paixões não as supera.”
É preciso ir lá no fundo, fazer o mergulho interior para enfrentar o pior inimigo que existe: a sombra. Pois ela busca se esconder por trás dos medos, se alimenta da avidez dos vícios, se agarra às paixões da matéria e da ignorância. E, sem dúvida, é disso que são feitos os infernos aqui na Terra.
As diferentes sombras que habitam em nós.
Convém distinguir que existem dois arquétipos distintos de sombras:
1 – sombra pessoal. Todos têm. Ela é formada pelas frustrações, egoísmo, insegurança, medos, pessimismo, entre outros.
2 – sombra impessoal. Traz a raiz do mal, a essência da violência, é formada pela energia de todos os atos violentos, guerras e comportamentos de chacinas e matanças perpetrados pelo homem contra o homem, bem como a crueldade contra os animais e a natureza.
Ao falar sobre a sombra que habita em nós, estamos abordando a raiz do mal que está presente e operante no interior de cada um.
É um mecanismo de defesa não aceitarmos essa realidade, pois vivemos em um planeta de provas e expiações. Portanto, expiar é sofrer pelo mal causado em outras encarnações ou mesmo nessa, e a todo instante o nosso pensamento precisa meditar se não há uma importante avaliação sendo feita.
Para encontrar a luz que dissipa a sombra, é preciso parar de procurá-la.
Nas lides espiritualistas, principalmente, o que mais encontramos são pessoas que estão a todo momento buscando as melhores formas para encontrar a salvação, a purificação, a iluminação.
A percepção de uma instância de sombra em si, força essa pessoas a buscarem algo que as convença que estão se purificando, iluminando, melhorando seja lá o que for essa salvação que elas acreditem precisar.
Poucos percebem, entretanto, que na maioria dos casos essa é mais uma artimanha do ego, da sombra que se mostra como combatente do egoísmo para manter o seu poder sobre a pessoa.
Vemos exemplos disso nas mais diversas casas espiritualistas, onde pessoas acreditando estar no caminho da luz, buscando ser mais iluminadas, pois assim serão salvas.
Acredito ser o tempo de parar, de pensar mais profundamente. E parar de procurar pela luz.
Muitas vezes isso atrapalha, porque muita luz pode cegar.
A pretensão de ser luz pode cegar.
A igreja, que quis ser tão iluminada, que quis levar a luz aos povos pagãos na Idade Média, levou guerra e chacina com as Cruzadas.
Hitler, em seus delírios de pureza, perpetrou o holocausto, dizimando milhões de seres humanos
Chega, portanto, dessa pretensão de ser luz, de ser iluminado, de querer brilhar. Afinal, ao longo da história da humanidade, percebemos que todos aqueles que tiveram sonhos de grandeza, que quiseram brilhar e se elevar acima dos outros, que quiseram ser melhores que os outros, cometeram grandes tragédias, feriram pessoas, espalharam a morte.
Perceba que, por outro lado, aqueles que verdadeiramente trouxeram transformações positivas ao mundo, se postavam humildemente, eram os menores entre os pequenos.
Francisco de Assis, Chico Xavier, Madre Tereza de Calcutá, Irmã Dulce.
Veja esses exemplos, conheça a história deles.
Muitos podem dizer que os exemplos são muito elevados. Sim, diria até ser impossível para qualquer um de nós chegar perto. Mas ao conhecer a vida dessas pessoas que, como nós, também sofriam os imperativos da matéria, tinham fome, dores, sofriam cansaço, e ver o que faziam mesmo assim, talvez possamos nos sentir inspirados em fazer um pouco que seja.
“Quem olha para fora sonha, quem olha para dentro acorda.”
O tempo pede a coragem de olhar nos olhos do lado sombrio.
Estamos, sem dúvida, em um momento de transformação planetária.
“Ao que nos compete discernir, o único propósito da existência humana é jogar um pouco de luz nas trevas do mero ser.”
Mas o tempo dessa mudança depende muito de como cada um lidará com as suas sombras.
Depende de como irá empreender esforços para olhar nos olhos do seu lado sombrio e acolher tudo aquilo que não é belo ou construtivo.
Reconhecer a pequenez dos sentidos e, então, acolher o pobre ser alquebrado e, mesmo que seja desconfortável, frio, doloroso e escuro, aproveitar esse encontro para acolher a quem somos.
José Batista de Carvalho
Referências
As citações no texto acima são de “Star Wars” (produção cinematográfica) e de Carl Gustav Jung