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O umbral, na descrição da experiência pessoal de André Luiz

cena do filme Nosso Lar onde André Luiz está no umbral umbral André Luiz

A descrição de André Luiz de sua passagem pelo umbral.

André Luiz começa ‘Nosso Lar’ com a descrição de suas experiências e das suas impressões na passagem pelo umbral. São os relatos de sua estada por essa região de transição para as áreas mais elevadas do plano espiritual.

Devemos lembrar que cada um passa e percebe o umbral de acordo com a sua própria experiência, como consequência de seus atos e de acordo com as concepções que tem sobre a vida após a morte.

Em seu primeiro livro, psicografado por Chico Xavier, o prefácio escrito por Emmanuel explica que a verdadeira identidade do médico terrestre ficaria no anonimato “para não ferir corações amados, envolvidos ainda nos velhos mantos da ilusão”, adotando, portanto, um nome para identificar-se em sua atual condição.

Conforme as palavras de Emmanuel, muitos outros autores espirituais já relataram as “condições da vida, além-túmulo”, mas André Luiz se apresentava com a oportunidade de “transmitir a outrem o valor da experiência própria, com todos os detalhes possíveis à legítima compreensão da ordem que preside o esforço dos desencarnados laboriosos e bem ­intencionados, nas esferas invisíveis ao olhar humano, embora intimamente ligadas ao planeta.”

Vamos, então, acompanhar algumas das passagens nessa narrativa de André Luiz, que pode ser lida na íntegra na obra ‘Nosso Lar’.

A passagem de André Luiz pelo umbral.

“Eu guardava a impressão de haver perdido a ideia de tempo. A noção de espaço se perdera. Estava convicto de não mais pertencer ao número dos encarnados no mundo e, no entanto, meus pulmões respiravam a longos haustos.

Cabelos eriçados, coração aos saltos, medo terrível senhoreando-me, muita vez gritei como louco, implorei piedade e clamei contra o doloroso desânimo que me subjugava o espírito; mas, quando o silêncio implacável não me absorvia a voz estentórica, lamentos mais comovedores que os meus respondiam-me aos clamores.

Outras vezes gargalhadas sinistras rasgavam a quietude ambiente. Formas diabólicas, rostos alvares, expressões animalescas surgiam, de quando em quando, agravando-me o assombro. A paisagem, quando não totalmente escura, parecia banhada de luz alvacenta, como que amortalhada em neblina espessa, que os raios de Sol aquecessem de muito longe.

Atormentava-me a consciência: preferiria a ausência total da razão, o não-ser. De início, as lágrimas lavavam-me incessantemente o rosto e apenas, em minutos raros, felicitava-me a bênção do sono. Interrompia-se, porém, bruscamente, a sensação de alívio. Seres monstruosos acordavam-me, irônicos; era imprescindível fugir deles.

O reconhecimento da verdadeira condição de espíritos eternos.

Em momento algum, o problema religioso surgiu tão profundo a meus olhos. Os princípios puramente filosóficos, políticos e científicos figuravam-se-me agora extremamente secundários para a vida humana.

Significavam, a meu ver, valioso patrimônio dos planos da Terra, mas urgia reconhecer que a humanidade não se constitui de gerações transitórias e sim de Espíritos eternos, a caminho de gloriosa destinação.

Verificava que alguma coisa permanece acima de toda cogitação meramente intelectual. Esse algo é a fé, manifestação divina ao homem. Semelhante análise surgia, contudo, tardiamente.

De fato, conhecia as letras do Velho Testamento e muita vez folheara o Evangelho; entretanto, era forçoso reconhecer que nunca procurara as letras sagradas com a luz do coração.

A surpresa ao analisar a vida que ficou para trás.

Em verdade, não fora um criminoso, no meu próprio conceito. A filosofia do imediatismo, porém, absorvera-me.

Filho de pais talvez excessivamente generosos, conquistara meus títulos universitários sem maior sacrifício, compartilhara os vícios da mocidade de meu tempo, organizara o lar, conseguira filhos, perseguira situações estáveis que garantissem a tranquilidade econômica do meu grupo familiar, mas, examinando atentamente a mim mesmo, algo me fazia experimentar a noção de tempo perdido, com a silenciosa acusação da consciência.

Habitara a Terra, gozara-lhe os bens, colhera as bênçãos da vida, mas não lhe retribuíra ceitil do débito enorme. Tivera pais, cuja generosidade e sacrifícios por mim nunca avaliei; esposa e filhos que prendera, ferozmente, nas teias rijas do egoísmo destruidor.

Possuíra um lar que fechei a todos que palmilhavam o deserto da angústia. Deliciara-me com os júbilos da família, esquecido de estender essa bênção divina à imensa família humana, surdo a comezinhos deveres de fraternidade.

Enfim, como a flor da estufa, não suportava agora o clima das realidades eternas. Não desenvolvera os germes divinos que o Senhor da Vida colocara em minha alma. Sufocara-os criminosamente, no desejo incontido de bem-estar.

Oh! Amigos da Terra! Quantos de vós podereis evitar o caminho da amargura com o preparo dos campos interiores do coração? Acendei vossas luzes antes de atravessar a grande sombra. Buscai a verdade, antes que a verdade vos surpreenda. Suais agora para não chorardes depois.

Ansioso por um pouco de paz para delinear os pensamentos.

‘Suicida! Suicida! Criminoso! Infame!’, gritos assim, cercavam-me de todos os lados. Gargalhadas sarcásticas feriam-me os ouvidos, enquanto os vultos negros desapareciam na sombra.

Para quem apelar? Torturava-me a fome, a sede me escaldava. Comezinhos fenômenos da experiência material patenteavam-se-me aos olhos. Crescera-me a barba, a roupa começava a romper-se com os esforços da resistência, na região desconhecida.

A circunstância mais dolorosa, no entanto, não é o terrível abandono a que me sentia votado, mas o assédio incessante de forças perversas que me assomavam nos caminhos ermos e obscuros. Irritavam-me, aniquilavam-me a possibilidade de concatenar ideias.

Desejava ponderar maduramente a situação, esquadrinhar razões e estabelecer novas diretrizes ao pensamento, mas aquelas vozes, aqueles lamentos misturados de acusações nominais, desnorteavam-me irremediavelmente.

A incompreensão, o cansaço, o desânimo.

‘Que buscas, infeliz! Aonde vais, suicida?’. Tais objurgatórias, incessantemente repetidas, perturbavam-me o coração. Infeliz, sim; mas, suicida? Nunca! Essas increpações, a meu ver, não eram procedentes. Eu havia deixado o corpo físico a contragosto.

Recordava meu porfiado duelo com a morte. Ainda julgava ouvir os últimos pareceres médicos, enunciados na Casa de Saúde; lembrava a assistência desvelada que tivera, os curativos dolorosos que experimentara nos dias longos que se seguiram à delicada operação dos intestinos. Por que a pecha de suicídio, quando fora compelido a abandonar a casa, a família e o doce convívio dos meus?

Firme e resoluto a princípio, comecei por entregar-me a longos períodos de desânimo e, longe de prosseguir na fortaleza moral, por ignorar o próprio fim, senti que as lágrimas longamente represadas visitavam-me com mais frequência, extravasando do coração. A quem recorrer?

Todo o conhecimento dissolvendo-se como bolhas de sabão.

Por maior que fosse a cultura intelectual trazida do mundo, não poderia alterar, agora, a realidade da vida. Meus conhecimentos, ante o infinito, semelhavam-se a pequenas bolhas de sabão levadas ao vento impetuoso que transforma as paisagens. Eu era alguma coisa que o tufão da verdade carreava para muito longe.

Entretanto, a situação não modificava a outra realidade do meu ser essencial. Perguntando a mim mesmo se não enlouquecera, encontrava a consciência vigilante, esclarecendo-me que continuava a ser eu mesmo, com o sentimento e a cultura colhidos na experiência material.

Persistiam as necessidades fisiológicas, sem modificação. Castigava-me a fome todas as fibras e, nada obstante, o abatimento progressivo não me fazia cair definitivamente em absoluta exaustão.

De quando em quando, deparavam-se-me verduras que me pareciam agrestes, em torno de humildes filetes d’água a que me atirava sequioso. Devorava as folhas desconhecidas, colava os lábios à nascente turva, enquanto mo permitiam as forças irresistíveis, a impelirem-me para frente. Muita vez suguei a lama da estrada, recordei o antigo pão de cada dia, vertendo copioso pranto.

Não raro, era imprescindível ocultar-me das enormes manadas de seres animalescos, que passavam em bando, quais feras insaciáveis. Eram quadros de estarrecer! Acentuava-se o desalento.

O primeiro raio de luz da consciência vem iluminar a longa noite sombria.

Foi quando comecei a recordar que deveria existir um Autor da Vida, fosse onde fosse. Essa idéia confortou-me. Eu, que detestara as religiões no mundo, experimentava agora a necessidade de conforto místico.

Médico extremamente arraigado ao negativismo da minha geração, impunha-se-me atitude renovadora. Tornava-se imprescindível confessar a falência do amor-próprio, a que me consagrara orgulhoso.

E, quando as energias me faltaram de todo, quando me senti absolutamente colado ao lodo da Terra, sem forças para reerguer-me, pedi ao Supremo Autor da Natureza me estendesse mãos paternais, em tão amargurosa emergência.

Quanto tempo durou a rogativa? Quantas horas consagrei à súplica, de mãos postas, imitando a criança aflita? Apenas sei que a chuva das lágrimas me lavou o rosto; que todos os meus sentimentos se concentraram na prece dolorosa.

Estaria, então, completamente esquecido? Não era, igualmente, filho de Deus, embora não cogitasse de conhecer-lhe a atividade sublime quando engolfado nas vaidades da experiência humana? Por que não me perdoaria o Eterno Pai, quando providenciava ninho às aves inconscientes e protegia, bondoso, a flor tenra dos campos agrestes?

Enfim chega ao umbral o socorro para André Luiz.

Ah! É preciso haver sofrido muito, para entender todas as misteriosas belezas da oração; é necessário haver conhecido o remorso, a humilhação, a extrema desventura, para tomar com eficácia o sublime elixir de esperança.

Foi nesse instante que as neblinas espessas se dissiparam e alguém surgiu, emissário dos Céus. Um velhinho simpático me sorriu paternalmente. Inclinou-se, fixou nos meus os grandes olhos lúcidos, e falou: ‘Coragem, meu filho! O Senhor não te desampara.’

Amargurado pranto banhava-me a alma toda. Emocionado, quis traduzir meu júbilo, comentar a consolação que me chegava, mas, reunindo todas as forças que me restavam, pude apenas inquirir: ‘Quem sois, generoso emissário de Deus?’

O inesperado benfeitor sorriu bondoso e respondeu: ‘Chama-me Clarêncio, sou apenas teu irmão.’ E, percebendo o meu esgotamento, acrescentou: ‘Agora, permanece calmo e silencioso. É preciso descansar para reaver energias.’

Em seguida, chamou dois companheiros que guardavam atitude de servos desvelados e ordenou: ‘Prestemos ao nosso amigo os socorros de emergência.’ Alvo lençol foi estendido ali mesmo, à guisa de maca improvisada, aprestando-se ambos os cooperadores a transportarem-me, generosamente.

Quando me alçavam, cuidadosos, Clarêncio meditou um instante e esclareceu, como quem recorda inadiável obrigação: ‘Vamos sem demora. Preciso atingir “Nosso Lar” com a presteza possível.'”

André Luiz

Ainda Emmanuel.

“André Luiz vem contar a você, leitor amigo, que a maior surpresa da morte carnal é a de nos colocar face a face com a própria consciência, onde edificamos o céu, estacionamos no purgatório ou nos precipitamos no abismo infernal; vem lembrar que a Terra é oficina sagrada e que ninguém a menosprezará, sem conhecer o preço do terrível engano a que submeteu o próprio coração.

Guarde a experiência dele no livro d’alma. Ela diz bem alto que não basta à criatura apegar­-se à existência humana, mas precisa saber aproveitá-­la dignamente.” (Emmanuel, 03 de outubro de 1943, prefácio de ‘Nosso Lar’)

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